19 de outubro de 2009

Sete dias depois, as autárquicas 2009 na cidade de Lisboa

E agora, José?

Falemos claro e cristalino sobre o que se passou em Lisboa. O resultado eleitoral da CDU, para as Assembleias de Freguesia foi de 33 337 votos, ou seja, 13, 32%, enquanto que para a Câmara Municipal, foi de apenas 22 623 votos, correspondentes a 8,07% dos mesmíssimos votantes. Sem floreados, nem eufemismos, no passado dia 11 de Outubro, catorze mil setecentos e catorze (sim, 14 714) eleitores votaram CDU “com toda a confiança”, para as Freguesias, e António Costa para a Câmara. Será que com a mesma confiança?
Além desta transferência avultada de votos, sabemos de outros dois factos: um, António Costa e seus aliados, não só não partilham entre si os mesmos ideais e projectos para a cidade, como, longe disso, não entendem ou procuram sequer entender as propostas e programas de acção preconizados pela CDU; outro, que com estes 14 714 votos a CDU teria eleito não 1, mas 2 vereadores, e o A. Costa teria vencido as eleições, mas apenas com uma maioria relativa. Melhor cenário para quatro anos de cidade verdadeiramente plural e de esquerda?
Duvidas, José? Faz as contas por ti e concluirás como eu.

Reconheçamos o agudizar da bipolarização ao centro e também o receio, ou mesmo o medo, do possível regresso de Santana Lopes à condução dos destinos da cidade de Lisboa, nossa amada cidade, como factores reais que contribuíram para a concentração do chamado “voto útil” em A. Costa. Sejamos um pouco mais serenos e sérios, menos histeria, menos superficialidade nas razões de um voto que se quer consciente e livre. Sim, histeria, de um lado e doutro, a histeria daqueles que idolatram Santana qual salvador messiânico e a histeria daqueles que o receiam. Agora, daí ao medo irracional, ao pânico ou ao pavor? Credo é assim tanta a desconfiança que temos de nós próprios? Em democracia, as nossas escolhas não deveriam ser pautadas pelo melhor e não pelo menos mau?

E agora, Carlos?

Claro que a teoria da “constipação” de Santana, não adere à realidade. Se é certo que o teu voto e o de largos milhares de outros se depositaram nas urnas com o voto expresso na CDU para as Assembleias de Freguesia, e, no A. Costa para a Câmara, é falso que tal se deva a sugestão, conselho ou acto de estratégia programática, de qualquer comunista com responsabilidades. Não, não houve sequer o apelo que Cunhal fez aquando da eleição de Soares à presidência da República nos idos da década de oitenta.
Tal voto, foi útil para quê e para quem? Reduzida ficou a pluralidade dos vereadores da futura Câmara e reduzida também a força humana que desde sempre se encontra diariamente disponível para ouvir, quer os apelos dos cidadãos de Lisboa, quer os trabalhadores da edilidade, de cada vez que são alvo de injustiça ou de atropelo dos seus direitos e dignidade. Nos últimos 4 anos, dois vereadores da CDU não tiveram mãos a medir para conseguir acudir a todos. Agora, apenas com um vereador, embora reconhecidamente batalhador e trabalhador, será difícil fazer mais e melhor do que se vinha fazendo. Repito a pergunta, o teu voto foi útil para quê e para quem? Fez falta a quem?

E agora, Manuel?

Depois do encontro ocasional para tomar café, agora custa a sua digestão? Estaria docemente envenenado?
Outro Manuel (este, apenas “alegrete”), por um lado, brinda-te com uma apreciação redundante e retórica, em entrevista recente a propósito do teu apoio à lista de A. Costa, ao afirmar que tu pensas pela tua cabeça (olhem a novidade, quero crer que sempre o tenhas feito), por outro, em comício do PS para as Legislativas, reconheceu-se contentinho em contentar-se com a esquerda “possível”. Manuel, Manuel, desde quando nos contentamos com o possível, desde quando desistimos de realizar o impossível.
Amigos e camaradas, tantos ficaram já pelo caminho e não apenas pela exaustão física ou pela morte, também muitos pelo definhar do ideal, pela falência do sonho. Que fazer agora com a maioria absoluta do A. Costa? Como suprir a falta de uma outra voz, um outro olhar com peso determinante para equilibrar, harmonizar e dar um desenho de futuro e de justiça à vida na cidade? É que com o teu voto na CDU também para a Câmara, A. Costa seria presidente na mesma (embora mais à pele) com uma bancada de 7 ou 8 vereadores e a CDU estaria lá para fazer verdadeira diferença com 2 ou até 3 vereadores. Também tu duvidas? Faz as contas Manuel, como eu as fiz. O método de Hondt tem destas coisas…

Sabes melhor do que eu que nesta esquerda se faz da competência, da honestidade e do trabalho, valores perenes para uma saudável existência. Rigor e cumprimento, fazem-nos resistentes à acomodação ou à alienação das nossas opções e projectos. Ainda recentemente, esmiuçando um dos episódios dos “Gato Fedorento”, vimos e ouvimos confirmações destes atributos. O convidado era o Jaime Gama, o próprio, que em cerca de 12 minutos de entrevista (além de inteligente, o programa é breve, e com isso não se perde muito tempo), fez três referências elogiosas a três nomes de rostos do PCP e exactamente pelo carácter cumpridor e rigoroso das suas acções e da sua conduta: - o camarada Bernardino, porque, como disse, no parlamento, nunca usa artifícios, o camarada Álvaro, pela elevação e integridade, o camarada Jerónimo, por ser fã do Benfica (pareceu ser elogio) e fanático do James Bond, uma vez que, conclui as suas intervenções parlamentares quando faltam 0:07 segundos para terminar. Consta que ninguém mais é capaz de tal prodígio na assembleia da república. Só um agente especial para realizar uma missão (que parece) impossível: levar avante o nosso projecto com toda a confiança. Cumprindo igualmente com a regra de usar da palavra no momento e no tempo dado, claro.

E agora José, Carlos e Manuel? E agora meus amigos e camaradas?

Fica a esperança de um dia o nosso voto ser genuinamente livre e democrático e, por isso, orientado pelo princípio da escolha preferencial pelo que é melhor, ao invés de nos mantermos subservientes e amordaçados à escolha assente no princípio utilitarista do menos mau. Para quando optar pelo que se quer e não pelo que se tem de engolir?
E até amanhã, que a luta continua.

Rui Pedro

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